FRANÇOISE GILOT: A ÚNICA MUSA DE PICASSO QUE O ABANDONOU
Se a proverbial "inveja do pênis" revelada por Freud é ou não uma produção social, o certo é que a crença de que uma mulher apenas se constitui como sujeito e passa a ter uma identidade através do falo de um homem com o qual se relacione afetivamente tem integrado o processo de subjetivação feminina há milênios. Sem esse elo com o falo masculino, a cultura desde sempre vociferou: A mulher não existe. Assertiva em outro contexto sustentada por Lacan que acrescentou que a " a mulher já É toda um falo".
Vencidas essas preliminares psicanalíticas, vamos a Françoise Gilot, aquela que muitos conhecem através do sem-número de retratos pintados por seu amante e companheiro por 10 anos, Pablo Picasso.
Gilot foi uma mulher fálica que se relacionou com um homem extremamente fálico e, provavelmente, por isso, não sucumbiu às faces medonhas do gênio. Se as demais mulheres do pintor, mesmo que enlouquecidas por suas perversões (algumas chegaram ao suicídio), a fim de se afirmarem como sujeitos por osmose, endossavam o discurso de que é melhor um romance trágico com um gênio, do que a paz com um homem medíocre (logo, menos fálico), esse não foi o caso de Françoise Gilot.
Sendo 40 anos mais jovem do que seu amante perro y bruto com quem teve dois filhos, Paloma e Claude, ao conhecer Picasso e ser por ele assediada, Françoise era uma reconhecida pintora de aquarelas e ceramista, além de já ter duas graduações: Pela Sorbonne e pela Universidade de Cambridge.
A vida com Picasso, que começou como uma fascinante relação de trocas e inspiração recíprocas, foi descambando para abusos e violências, como era o roteiro useiro e vezeiro de suas uniões, além de relegar o talento artístico de Françoise à uma sombra intransponível cujo peso maior era dado pelo egocentrismo do malaguenho.
A fim de se salvar, Françoise o abandonou sem que antes ele tivesse destruído grande parte de suas telas e sem que depois, ele tivesse exigido que nenhuma galeria expusesse os seus quadros.
Mas, Françoise Gilot sobreviveu a Picasso. Em todos os sentidos. Na arte e na vida: Expôs, amou e teve outra filha. Tendo falecido aos 101 anos de idade.