quinta-feira, 10 de julho de 2025

 FRANÇOISE GILOT: A ÚNICA MUSA DE PICASSO QUE O ABANDONOU















Se a proverbial "inveja do pênis" revelada por Freud é ou não uma produção social, o certo é que a crença de que uma mulher apenas se constitui como sujeito e passa a ter uma identidade através do falo de um homem com o qual se relacione afetivamente tem integrado o processo de subjetivação feminina há milênios. Sem esse elo com o falo masculino, a cultura desde sempre vociferou: A mulher não existe. Assertiva em outro contexto sustentada por Lacan que acrescentou que a " a mulher já É toda um falo".

Vencidas essas preliminares psicanalíticas, vamos a Françoise Gilot, aquela que muitos conhecem através do sem-número de retratos pintados por seu amante e companheiro por 10 anos, Pablo Picasso. 

Gilot foi uma mulher fálica que se relacionou com um homem extremamente fálico e, provavelmente, por isso, não sucumbiu às faces medonhas do gênio. Se as demais mulheres do pintor, mesmo que enlouquecidas por suas perversões (algumas chegaram ao suicídio), a fim de se afirmarem como sujeitos por osmose, endossavam o discurso de que é melhor um romance trágico com um gênio, do que a paz com um homem medíocre (logo, menos fálico), esse não foi o caso de Françoise Gilot. 

Sendo 40 anos mais jovem do que seu amante perro y bruto com quem teve dois filhos, Paloma e Claude, ao conhecer Picasso e ser por ele assediada, Françoise era uma reconhecida pintora de aquarelas e ceramista, além de já ter duas graduações: Pela Sorbonne e pela Universidade de Cambridge. 

A vida com Picasso, que começou como uma fascinante relação de trocas e inspiração recíprocas, foi descambando para abusos e violências, como era o roteiro useiro e vezeiro de suas uniões, além de relegar o talento artístico de Françoise à uma sombra intransponível cujo peso maior era dado pelo egocentrismo do malaguenho.

 A fim de se salvar, Françoise o abandonou sem que antes ele tivesse destruído grande parte de suas telas e sem que depois, ele tivesse exigido que nenhuma  galeria expusesse os seus quadros. 

Mas, Françoise Gilot sobreviveu a Picasso. Em todos os sentidos. Na arte e na vida: Expôs, amou e teve outra filha. Tendo falecido aos 101 anos de idade.

terça-feira, 8 de julho de 2025

 OSKAR KOKOSCHKA E ALMA MAHLER: UM CASO DE BONEQUICÍDIO


Há algum tempo, discorri nesse espaço virtual,  o tórrido caso de amor entre Alma Mahler e Oskar Kokoschka. Mas, não narrei o seu desfecho. Os que se interessarem, convido-os a acompanharem-me.

A bela e talentosa Alma Mahler havia sido casada com o compositor Gustav Mahler. Este,  por sua vez, ao tê-la proibido de desenvolver seus dotes musicais, o que a levou a uma profunda depressão, recebeu em troca por sua opressão, o romance de sua mulher com Walter Gropius.

Nem Freud conseguiu salvar este casamento, tendo Gustav Mahler morrido de tristeza aos cuidados de Alma. Uma vez viúva, antes de vir a se casar com Gropius, Alma Mahler teve um caso incendiário com o pintor Oskar Kokoschka. Paixão que não resistiu à possessividade e arrebatamentos do artista. Ao separar-se do pintor, este alistou-se no exército austro-húngaro e partiu para a Primeira Guerra Mundial a fim de "esfriar a cabeça".

Tendo sobrevivido aos fronts de batalha, terminada a guerra, Kokoschka encontrou Alma Mahler já casada com Walter Gropius em Viena. Inconsolável, encomendou a confecção de uma boneca de mesma altura, tamanho e características da amante perdida. Com essa boneca, consolou-se por anos a fio.

Até que certo dia, nos primeiros raios de um sol que se enxeria, após uma noitada regada a muito vinho, barulho e outras substâncias, a vizinhança chamou a polícia por terem visto um corpo degolado e banhado em sangue no jardim de Kokoschka.

Sob os olhos atentos daqueles que espreitavam sobre o muro da casa do pintor, a polícia se aproximou e percebeu que o corpo ensanguentado sem cabeça era, na verdade, o de uma boneca encharcada em vinho. A boneca sem Alma de Kokoschka...

Loïe Fuller

 LOÏE FULLER: A BAILARINA DAS R(EVOLUÇÕES)


Essa bailarina americana que assim como Isadora Duncan, depois dela, transformou as artes cênicas e é aclamada como a bailarina da  Belle Époque, é, primacialmente, uma bailarina da Revolução Industrial. Ao trazer para o palco, canhões de luzes e espelhos, diríamos, inclusive, que Loïe Fuller seria uma precursora dos efeitos especiais na arte.


Li a sua autobiografia, assim como li a de Isadora Duncan e posso dizer sem fazer nenhuma concessão que foram das mais belas páginas que já li sobre a dança e o seu potencial de despertar encanto e fascínio.


Em 2016 foi lançado um filme francês sobre a vida de Loïe Fuller "La Danseuse", assisti-o recentemente, e mais do que uma decepção, o filme é um desrespeito à biografia da bailarina que foi escrita por ela própria, repito.


O filme é misógino, pois macula a feminilidade de Loie e as questões de gênero referentes às mulheres em todos os sentidos. 

Primeiro ao colocá-la como uma mocinha trivial que é alçada ao sucesso escalando o corpo de um homem sob os lençóis: Ora, não há homens como parceiros erótico-afetivos na vida da artista, uma vez que ela era, declaradamente, lésbica! Dedicando, inclusive, um capítulo de sua autobiografia à sua bem-amada, Gab. 

Segundo, por retratar a sua mãe como uma megera, quando em verdade, foi sua dedicada companheira pela vida inteira,  acompanhando-a em inúmeras turnês ao redor do mundo e morando com ela em Paris. Sendo que foi a morte da mãe que a deixou em um torpor tal que a fez deixar a dança e se dedicar à escrita.

O filme, que ganhou prêmios em Cannes, distorceu tanto a vida da artista que debates indignados sobre o tema foram promovidos por várias mídias na França.

Enfim, na narrativa de uma história discorrida por homens, ou se invisibiliza as mulheres de gênio ou se distorce radicalmente as suas histórias, desrespeitando-as .

Que as luzes bailantes de Loïe Fuller triunfem sobre esse insistente obscurantismo e continuem a lançar seus raios sobre nós!