sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020


GRANDE SERTÃO: VEREDAS - UMA LEITURA QUE NÃO CESSA.



Há mais de dez anos, venho lendo o romance Grande Sertão: Veredas, e sei que não estou sozinha nessa travessia. Todo leitor dessa obra-prima "surregionalista" como a designou Antonio Candido já fez várias leituras e releituras radicais do livro. Que o diga o professor Willi Bolle, alemão que veio para o Brasil em 1966 com o único fito de estudar o romance e conhecer o seu autor e que não pára de ler o livro há mais de 50 anos! 

Eu, nas minhas humildes leituras desse sertão inesgotável, posso dizer que já o li sob três vieses: por primeira vez, enredei-me no romance como quem se enovela nos impossíveis do amor, era o impossível do amor que me capturava e me tinha por abatida nas veredas dessas linhas. Na segunda vez, fiz uma leitura jurídica e sociológica, detive-me no sertão civilizacional onde não havia instituições, mas havia a lei fundada nos princípios fundamentais do direito. Até que finalizei uma terceira leitura na qual o livro se descortinou para mim com luzes outras. Ao invés de focar apenas em Riobaldo e o seu "monólogo", decidi por ler o livro como o que ele realmente é: um diálogo. E procurei descobrir o máximo de seu interlocutor que é mudo e cuja fala escutamos apenas através da fala do único que nos fala: Riobaldo. Esse interlocutor é um doutor pesquisador da cidade que vem visitar Riobaldo em seu jipe e para quem Riobaldo narra e procura entender a trajetória de sua vida. Há quem diga que esse doutor ocupe o lugar do psicanalista. Deveras. Mas, tenho uma outra intuição: esse doutor ocupa o lugar da ciência, da racionalidade. Esse doutor é o racional em diálogo com o trágico personificado em Riobaldo. Eis, então, sob que tintas vejo hoje essa obra: sob as tintas de uma confrontação entre a racionalidade e a tragicidade, confrontação essa a engendrar o homem humano. No mais, sempre haverá outras novas leituras outras. Travessia.





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