domingo, 1 de agosto de 2021

 ARTE E MODA





Se Ítalo Calvino nos diz que um clássico é um livro que não cessa de nos dizer aquilo que tem para nos dizer, um clássico da moda é um modo de trajar-se que não cessa de se nos oferecer à fruição dos sentidos, sobretudo escópicos para quem o vê, sobretudo táteis para quem o veste.
O traje e os seus adornos são signos. Signos que se propõem a mobilizar atenção e o desejo daqueles com quem se comunicam. Sim, a moda é uma forma de comunicação e não é sem razão que há aqueles que portam roupas com frases, expressões e outros signos linguísticos.
Mas, um clássico na moda é aquele que também se oferece cripticamente, em mistério. Num jogo infinito de ocultação e desvelamentos.
Teria o quadro da Monalisa de Leonardo da Vinci a mesma força se a Gioconda trouxesse ao pescoço um portentoso colar? Assim, como, estaria a Dama com o Unicórnio de Rafael com a mesma sensual languidez se os seus cabelos estivessem soltos sobre o colo?
Por certo que as obras desses ícones do renascimento italiano não deixariam de ocupar o panteão dos gênios, mas os pintores, como grandes estilistas que são, sabem ou intuem que um colar pede um colo livre de panos e de madeixas, como o da modelo de Rafael, assim como um colo sobre o qual derramam-se madeixas e farto panejamento como o da Monalisa, recusa um colar.
São lições de moda que atravessam as modas e que através da arte fazem perpetuar em nós o enigma do feminino. Esse que mais do que o sorriso da Monalisa, será sempre indesnudável.
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Telas: Leonardo da Vinci: Monalisa (1503)
Rafael Sanzio: A Dama e o Unicórnio (1506)

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