domingo, 1 de agosto de 2021

 ARTE E MODA




Você diria que a Maja Vestida, a bela tela de Goya que dialoga com a tela, também de sua autoria, a Maja Desnuda, está vestida com trajes masculinos?
Volto atrás para me fazer entender em meu argumento. Há alguns dias, li, aqui pela Internet, um artigo no qual rapazes afirmavam que, após as suas namoradas haverem tosado os cabelos, os seus desejos haviam se desmanchado no ar. Que haviam insistido nos relacionamentos, mas diante da necessária objetividade do desejo masculino que havia arrefecido, o fim fora incontornável.
No artigo, sustentava-se que o fenômeno se devia ao fato de os homens estarem escravizados a sinais de feminilidade que, uma vez ausentes, retiravam-se-lhes o desejo. A meu ver a assertiva não é falsa, no entanto, fica a meio caminho do cerne da questão: tenho a suposição de que a grande razão para o arrefecimento do desejo masculino nessas condições é o medo, ou melhor, o pavor do homem quanto à sua própria homossexualidade, aos seus eventuais desejos homoeróticos. A namorada de cabelo tosado pode remeter o rapaz, em uma cultura na qual o masculino é identificado com os cabelos bem curtos, a uma relação homoerótica que o mesmo pretende rechaçar.
No entanto, esse jogo sexual ocorre todo o tempo através de artifícios da moda que, de forma velada e subreptícia, brinca com a bissexualidade humana, mais ainda, com uma latente homossexualidade masculina que está sempre à espreita. Por serem sinais discretos, os homens não se apavoram com um eventual contato com um desejo homossexual, mas podem gozar de um prazer não identificado com o homoerotismo, mas que no entanto, é homoerótico.
Dito isto, volto à Maja Vestida de Goya. A Maja, que há séculos mobiliza os desejos masculinos, está vestida de homem, de toureiro, para ser mais específica. Mas, de forma sutil. Todo o seu traje corresponde à tauramaquia sevilhana. No entanto, ao invés da obrigatória camisa branca dos toureiros, ela traz sobre o belo corpo de mulher, uma camisola branca. O cor de rosa das meias dos toureiros transforma-se na faixa rosa a envolver a cintura da Maja. As sapatilhas estão de acordo com as melhores Arenas de torear e, coroando o traje de forma a não deixar dúvidas sobre a intenção do pintor: o capote de passeio bordado em seda e ouro. Este, a maior distinção de um toreador, que ao tempo de Goya era uma prática, exclusivamente, masculina.
As roupas humanas, não apenas servem para nos proteger das intempéries da natureza, mas para velar e desvelar, para brincar com a sexualidade humana que é, sobretudo simbólica. E para nos permitir ter acesso ao que no mais profundo de nós, driblamos: Olé!!!!

Nenhum comentário:

Postar um comentário