terça-feira, 26 de janeiro de 2021

 OLHAR DE DENTRO, OLHAR DE FORA.




Não conhecia esse belo grafite, de autoria do artista plástico Kbça, desenhado desde 2017 nos muros de uma casa em uma rua próxima da Universidade onde ensino. Adoro arte, gosto de urbanismo, mas não conhecia essa obra que acontece na minha cidade todos os dias. Foi preciso que Mia Couto, que esteve no Recife ou alguém que o represente, lá de Moçambique, se lembrasse dessa arte e divulgasse essa porção de água do rio que corre na minha aldeia para que eu a conhecesse. E, assim, muitas vezes será.
Assim muitas vezes será porque nunca conhecerei a profundidade e todas as margens do rio que passa na minha aldeia. Assim muitas vezes será porque não me vejo em meus próprios olhos, e Narciso pouco deles me ensina diante do espelho. Assim sempre será, porque mais do que se tratar de colonialismos e subalternizações, trata-se de interdependências e do diálogo necessário. Trata-se de ser visto e nomeado pelo outro para nascermos. O tempo atual, no mundo global que construímos, mais do que nunca, nos mostrou o quanto estamos juntos, misturados e intrincados. O quanto o outro, a despeito de nossas vontades, nos afeta e o quanto estamos permanentemente e irrecorrivelmente, a afetar o outro. A despeito de distâncias reais, as proximidades há muito deixaram de ser simbólicas.
Assim muitas vezes será porque eu sou o outro e o outro sou eu. E, não poucas vezes será o outro que virá me contar do rio da minha aldeia. E me falará de suas cores e até mesmo de seus caprichos. E nele me ajudará a mergulhar para nadarmos, juntos.

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