sábado, 8 de janeiro de 2022

A cela de Ezra Pound

 



E por falar em RESISTÊNCIA, a cela da morte na qual ficou enjaulado o considerado maior poeta americano, EZRA POUND.


Uma vez capturado na Itália por crime de  traição à pátria durante a Segunda Guerra Mundial, traição essa que consistia em versejar e esbravejar contra o American Way of Life  em um programa de rádio transmitido da Europa para o próprio Estados Unidos, Ezra Pound foi preso, ou para ser mais fiel aos fatos, enjaulado  no United States Army Disciplinary Training Center (USDTC), em Metato, ao norte da cidade de Pisa.


As condições dessas jaulas eram tão desumanas e degradantes que a imprensa americana as  apelidaram como sendo “o repositório dos sedimentos sujos de nossas tropas no teatro mediterrâneo”. Nelas eram encarcerados os militares americanos que haviam cometido gravíssimos crimes de guerra e que aguardavam julgamento da Corte Marcial ou transferência para um Tribunal dos EUA no qual a pena para a sua nefanda prática seria inevitavelmente a pena capital. Ou seja, o nosso poeta estava mesmo em meio aos seus iguais, sendo ele o único civil a soçobrar na jaula dantesca.


As altas e conscienciosas autoridades militares yankees ordenavam que o poeta deveria ficar “sob vigilância especial e permanente, para evitar a fuga ou o suicídio. Nenhum contato com a imprensa, nenhum tratamento privilegiado”. 


Essas jaulas eram verdadeiras "celas de morte", gaiolas revestidas de malhas de aço, abertas de modo a serem vistas por todos os lados. A cobertura, ao alto, era feita por uma lâmina de metal. O isolamento dos encarcerados era total, sendo os guardas proibidos de dirigir-lhes uma só palavra. Ainda assim, mesmo entrando em estado de decomposição a cada dia das três semanas que ali resistiu e sobreviveu, suportando o calor escaldante do dia e a poeira e o frio da noite,  Ezra Pound mantinha os seus olhos em direção às baixas colinas nas cercanias de Pisa cobertas por pinheirais onde tantas vezes desfrutara de passeios com amigos e familiares.


Mesmo sendo vedada a leitura que não fosse a Bíblia, Pound enjaulado em seu martírio, em meio a convulsões, tristeza e colapsos nervosos, continuou a escrever os seus poemas em folhas de papel higiênico, poemas esses que integrariam os "Cantos Pisanos". Eis uns de seus versos mais belos e emblemáticos:


"Quando a mente balança qual lâmina de grama


Uma pegada de formiga poderá salvá-lo"


E assim, versejando, Pound fincou a sua bandeira de resistência. Na gaiola da morte, plantou poesia e a partir dela,  manteve a liberdade de suas asas...


Andrea Campos


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Ilustração: Celas (jaulas da morte) nas quais foi engaiolado Ezra Pound.

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